Antagonismo nas commodities: Recessão no ocidente e reabertura da China em 2023
Mercado de commodities tem sido monotemático com a recessão no ocidente, ao mesmo tempo em que esquece da gradual reabertura chinesa. Esta leitura está correta? Me parece que não.
O ano de 2023 começa com um dilema: preços de commodities devem responder às expectativas de recessão no ocidente, ou a uma gradual reabertura da China? Esta é uma pergunta importante, cuja resposta é mais complexa do que esta dicotomia, bem como varia em função do tipo de matéria-prima.
Isto porque, embora os chineses sejam os maiores demandantes de commodities globalmente, existem algumas que são menos sensíveis a questões relacionadas ao país. Este é o caso, por exemplo, do café – do qual os chineses são os 18os maiores importadores. Trata-se de um país do chá, afinal de contas. Entretanto, metais e energia são extremamente relacionados ao ciclo econômico chinês, o que os confere maior vantagem em um ano que, muito provavelmente, as manchetes chamarão atenção à volta da normalidade no país – fechado por mais de dois anos, pela política de Covid-zero.
2023 será o ano em que a mais esperada recessão da história deverá atingir as economias ocidentais, principalmente as anglo-saxãs. Não faltam razões para que ela não ocorra. Houve a subida de juros mais violenta dos últimos 40 anos, fazendo com que decisões de investimento por parte de empresários fossem repensadas pelo alto custo dívida. Menos demanda agregada é gerada. Algo também importante de se comentar é que as expectativas parecem convergir para um único ponto de pessimismo. Todos estão negativos, receosos. Há muita incerteza. Keynes diria que o “animal spirit” está baixo. Sem o instinto animal, o ser humano pensa mais. E age menos. Toma menos risco.
Entretanto, há motivos para que esta possível recessão no ocidente, esperada para o primeiro trimestre de 2023, não seja nem tão duradoura, nem tão grave. A princípio, os números de produção industrial de economias centrais, como os EUA, continuam relativamente estáveis – mesmo com a maior subida de juros desde a década de 1970! A economia está resiliente. Mercado de trabalho, excepcionalmente apertado globalmente, deverá fazer com que o grau de barganha dos trabalhadores continue elevado em 2023 – o que leva a salários mais altos e, portanto, a um incremento do consumo.
Do ponto de vista histórico, recessões normalmente duram até 10 meses. As mais fortes giram em torno dos 17. Índices de renda variável apresentaram queda média nas últimas recessões, desde 2000, de algo próximo dos 60%. Olhando para o S&P500, estamos próximos dos 30%. Ou seja, há muita água para passar debaixo desta ponte! Um mercado monotemático, pelo menos até março, que apenas sabe falar de recessão é o esperado. Fatores periféricos ficam de fora, por ora.
O que será a marca de 2023 é que, ao passo que as nações anglo-saxãs batalham contra os efeitos da recessão, teremos a China gradualmente voltando ao mercado. A pergunta de um milhão de dólares é se Pequim retomará o seu nível de atividade em uma velocidade capaz de neutralizar os efeitos esperados da recessão e contração econômica, porém temporária, do ocidente. Particularmente, acredito que este cenário é factível. E isto seria uma combinação interessante para as commodities que têm exposição à China, somente. São elas os metais industriais, energia. Grãos&oleaginosas não compartilham deste mesmo sentimento, por sua demanda ser relativamente inelástica e em função do crescimento populacional.
O case dos metais é particularmente interessante porque os estoques globalmente do cobre, zinco e níquel, a exemplo, nunca estiveram tão baixos. Tradicionalmente, este é um mercado em que a oferta não acompanha a direção de preço no curto prazo. A operação de uma mina requer planejamento, e não pode ser alterada subitamente. Além disto, falta de água em regiões produtoras, como o Chile, cuja seca está sazonalmente alta pelo efeito do La Niña. Sem água, sem supressão de poeira e transporte de polpa. Importantíssimos para a operacionalidade de qualquer mina. A China tem a maior capacidade de fundição global destes metais, que deverá ser colocada para funcionar intensamente com a reativação da economia do país e uma maior demanda por ligas metálicas condutoras. Sem contar que o ocidente está alucinado por carros elétricos – que demandam muitos metais. Portanto, temos China e um impulso EV para dar ânimo a este mercado.
Do ponto de vista do petróleo e derivados, uma reabertura chinesa deverá adicionar ao consumo global destas commodities algo como 1.2 milhões de barris por dia. Em um momento no qual as exportações da Rússia caem pelo embargo e decisão do G7 de impor um teto ao preço do petróleo de Moscou, um aumento de demanda é um catalisador positivo de preço. Há de se lembrar que, no auge da crise financeira de 2008, apenas 2% da demanda global de líquidos caiu. Isto representa pouco menos de 2 milhões de barris. Em uma conta rápida, 1.13M bpd de reabertura da China+1.1M bpd de exportação perdida em dezembro da Rússia já compensariam uma queda no consumo da magnitude observada naquele ano.
Como está sendo observado, a reabertura da China deverá durar meses até que esteja totalmente concluída. Há setores que ainda não voltaram à atividade em função de falta de trabalhadores temporariamente desligados por estarem infectados. Outros que necessitam de autorização do governo para funcionar. Não é algo rápido. Os chineses são planejadores minuciosos, exatamente como requer uma economia marcada por fortes traços socialistas.
Portanto, temos uma configuração macro que se organiza da seguinte forma: a recessão no ocidente deverá se iniciar no primeiro trimestre de 2023. A princípio, terá uma duração de, no máximo 10 meses. Neste período, teremos a China voltando à sua normalidade completa. Portanto, uma perda de demanda no ocidente poderá apresentar algum grau de compensação vindo de Pequim. Atenção, logo, às commodities ligadas ao ciclo industrial chinês também demandadas pelo ocidente. Petróleo. Derivados. Alumínio. Zinco. Otimismo com o minério de ferro ainda não é unânime, por depender de uma recuperação do setor de construção civil na China. Algo que está longe de ocorrer, como abordarei em uma outra entrada no blog.
Obrigado por ler, e espere por mais textos em breve,
Heitor Paiva
Faltou celulose. Demanda crescente de 1 milhao de ton por ano faca chuva ou sol.